Estamos assistindo a mais um contra-senso. O Governo Federal edita medidas para combater os efeitos da crise financeira mundial tentando evitar aumento de encargos das empresas em dificuldades e quase decididas a demitir funcionários. Ao mesmo tempo, em 12 de janeiro último, o Decreto 6.727 acabou por gerar um significativo aumento da carga tributária quanto ao pagamento de contribuições previdenciárias sobre o aviso prévio indenizado, tanto para o empregador, cuja incidência de alíquotas podem variar entre 21% e 26%, dependendo da atividade econômica. Quanto para o empregado que passou a pagar a contribuição sobre o aviso prévio a uma alíquota que pode variar de 8% a 11%, dependendo do salário.
Esse Decreto revogou a alínea “f” do parágrafo 9° do artigo 214 do Decreto 3.048/99 que continha previsão explicita de não integrar o aviso prévio indenizado o salário de contribuição excluindo-o, conseqüentemente, do rol das parcelas tributáveis.
A nova exigência, contudo, se mostra ilegal já que aviso prévio indenizado não tem natureza salarial, motivo pelo qual não compõem a folha de salários. Trata-se de indenização de 30 dias paga pelo empregador quando ele decide demitir o empregado sem justa causa e sem o cumprimento do aviso prévio.
A Lei 8.212/91 foi omissa acerca da não incidência do aviso prévio indenizado na base de cálculo do salário de contribuição, mas não obstante a omissão, aquele não se destina a retribuir o trabalho tal como definido em seu art. 28, e, portanto, não tem qualificação para integrar o salário de contribuição, pois o aviso prévio indenizado não pode ser incluído no conceito de rendimento pago, devido ou creditado durante o mês destinado a retribuir o trabalho, em consonância com o artigo citado, que define o salário de contribuição.
Segundo o disposto no inciso I do artigo 28 da Lei 8.212/91, constitui salário de contribuição, para fins de incidência das contribuições previdenciárias:
“I - para o empregado e trabalhador avulso: a remuneração auferida em uma ou mais empresas, assim entendida a totalidade dos rendimentos pagos, devidos e creditados a qualquer título, durante o mês, destinados a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador e tomador de serviços nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa” (Redação dada pela Lei 9.528/97)
A expressão “destinados a retribuir o trabalho” indica que somente os rendimentos pagos como contraprestação pelo trabalho são passíveis de incidência de contribuições previdenciárias. E a verba do aviso prévio não guarda relação com o serviço prestado no período a que se refere, não se encaixando na hipótese de incidência da norma que instituiu o tributo, aliás, nesse sentido se assentou a Jurisprudência.
Independentemente de o aviso prévio ser computado no tempo de serviço para todos os efeitos legais, conforme previsto no artigo 487 da CLT, tal fato não torna o seu valor passível de incidência de contribuições previdenciárias, já que não é definido como “salário de contribuição”, pelo inciso I, do artigo 28, da Lei 8.212/91.
Não se pode esquecer que a regra do parágrafo 1°, do artigo 487, da CLT, tem cunho protetor da parte mais fraca na relação de emprego, visando proteger o empregado contra a falta de concessão da comunicação de dispensa. Garante não só o salário equivalente ao período do aviso prévio, mas também direitos que se tornam adquiridos no período em que o aviso prévio teria de ser cumprido.
Contudo, a mencionada regra não tem o poder de transformar a retribuição do tempo do aviso prévio não trabalhado em parcela de natureza salarial para fins de incidência das contribuições previdenciárias. Essas contribuições são recolhidas com base na definição dada pela norma tributária que instituiu esses tributos, não havendo espaço para alargar o seu campo de incidência, fora das previsões legais, a teor do inciso II, do artigo 5°, do inciso I, do artigo 150 e do artigo 195, todos da CF.
Portanto, o Decreto 6.727/2009 em nada altera a não incidência da Contribuição Previdenciária sobre o aviso prévio indenizado, pois não há na referida regra previsão de que a retribuição do período do aviso prévio não trabalhado constitui salário de contribuição. Deve prevalecer a regra prevista no inciso I, do artigo 28, da Lei 8.212/91, no sentido de que é salário de contribuição o valor pago como contraprestação pelo trabalho.
A não incidência de contribuição previdenciária sobre o aviso prévio indenizado não contraria o artigo 487 da CLT e o artigo 195 da Constituição Federal, combinados com o artigo 111 do Código Tributário Nacional, mostrando-se ilegal sua exigência. Por isso muitas empresas estão ingressando com pedido judicial de suspensão do pagamento de contribuições previdenciárias ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) sobre o aviso prévio indenizado, ou mesmo, pleiteando a restituição da contribuição paga a este titulo.
Alexandre Duarte Ferreira é advogado da Motta Advogados Associados.
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